Introdução
Deus afirma claramente que olha para os humildes. Ele também deixa claro que se opõe aos orgulhosos (1Pe 5.5). A humildade e o orgulho são características que não podem coexistir. Onde uma é encorajada, a outra é derrotada.
O Salmo 131 apresenta Davi colocando sua alma diante de Deus de uma maneira discreta, serena e profundamente interessada no crescimento em santidade de vida. Esse salmo é a confissão de humildade de Davi; feita humildemente, com agradecimento a Deus por sua graça, e não em vanglória.
Davi suplica a Deus dizendo que: I) Não almejava nada alto nem grande (Sl 131.1). II) Ele sentia-se muito confortável em toda condição que Deus lhe destinava (Sl 131.2); e, portanto: III) Ele encoraja todas as pessoas boas a confiar em Deus como ele confia (Sl 131.3)<1>.
O Dr. Wiersbe (2006, pág. 331), diz que:
Se havia alguém em Israel com motivações de sobra para se orgulhar, era Davi. Oitavo filho de um cidadão comum, Davi começou trabalhando como simples pastor de ovelhas e, no entanto, se tornou o maior rei de Israel. Soldado corajoso, general <...> talentoso e servo sincero de Deus, foi Davi quem derrotou os inimigos de Israel, expandiu as fronteiras de sua terra e ajuntou a riqueza que Salomão usou para construir o templo. Escreveu quase metade dos salmos e, apesar de (como nós) ser culpado de desobedecer ao Senhor, sempre se arrependeu e buscou o perdão misericordioso de Deus. Foi por amor a Davi que o Senhor manteve acesa sua lâmpada em Jerusalém durante os anos de decadência em Judá, e foi pela linhagem de Davi que Jesus Cristo veio ao mundo. Com exceção de algumas ocasiões em que cedeu a seus desejos egoístas, Davi andou com o Senhor mantendo sempre um espírito humilde.
O ponto do Dr. Wiersbe é que Davi, embora toda sua trajetória de lutas e conquistas, sua vida foi exemplo de humildade perante o Senhor.
A oração do salmista nos apresenta três lições importantes sobre o caminho da humildade que devemos trilhar, como peregrinos neste mundo. Vejamos:
i. O caminho da humildade deve ser trilhado com honestidade – Sl 131.1
O verso 1, ao que parece, soa como uma defesa pública da acusação de ser uma pessoa presunçosa. O salmista diz: “não é soberbo o meu coração”. De acordo com 1Sm 17.28, Davi foi acusado de presunção (orgulho/arrogância). É possível que essa acusação tivesse perseguido ele por muito tempo.
Seja como for, em oração, Davi disse três coisas para Deus e cada uma delas revela algo a respeito da natureza do orgulho.
Meu coração não é soberbo (arrogante/soberbo) – ou seja, ele não era o tipo de pessoa que vivia se vangloriando ou alimentando uma imagem de si mesmo, elevada demais.
Meus olhos não são altivos (exaltar-se, engrandecer-se) – creio que nesse ponto, Davi quis dizer que suas intenções não visavam os lugares altos em Israel ou os lucros do poder. Em seu coração não havia um desejo de ser popular.
Não ando à procura de coisas grandes ou maravilhosas – talvez, nesse ponto, Davi esteja dizendo que nunca teve a ambição de ser um rei. Sua fala revela que o orgulho normalmente conduz à presunção – desejando “grandes” coisas e procurando coisas “maravilhosas”. De qualquer forma, o ponto é que Davi procurou guardar o coração das fantasias pelo poder.
Davi era honesto consigo mesmo. Ele não pensava de si mesmo algo diferente do que ele realmente era. O caminho da humildade é para aqueles que reconhecem suas limitações. É para aqueles que sabem exatamente quem são diante de Deus e seus semelhantes. É para aqueles que são honestos e corajosos suficientes para buscarem apenas o que lhes é necessário, para que não seja destruído por ganancias maliciosas e perigosas.
O caminho da humildade produz no coração de todo servo do Senhor, um diagnóstico honesto de si mesmo e, ele é capaz de contentar-se com o que sabe de si mesmo e o que pode fazer com isso.
Jesus Cristo, mesmo sendo Deus, a si mesmo se esvaziou, assumindo a forma de servo e tornou-se em semelhança de homens, humilhou-se, tonando-se obediente até a morte e morte de cruz – Fp 2.7-8. Ele foi honesto consigo mesmo ao reconhecer que, enquanto estava entre os homens, tinha uma missão a cumprir e que isso envolvia esvaziar-se de toda a Sua glória e esplendor, mesmo que por um momento.
Depois de falar da honestidade como ponto de partida para trilhar o caminho da humildade, o salmista fala de mais uma lição importante. Vejamos:
ii. O caminho da humildade deve ser trilhado com maturidade – Sl 131.2
As crianças israelitas eram desmamadas aos 3 ou 4 anos de idade, um acontecimento que marcava o fim da primeira infância. Mas, de maneira geral, elas não desejavam serem privadas dos braços carinhosos da mãe e da segurança que encontram em seu colo.
Meus filhos, Pedro Augusto e Vitor Hugo, depois que foram desmamadas só queriam ficar no colo. Não se conseguia limpar a casa, fazer a comida ou qualquer outra coisa que lá estavam eles com os braços levantados pedindo colo. Ali eles se sentiam seguros, amados e confortáveis. Mas, vai chegando a certa idade, o colo vai sendo substituído por outras coisas. Assim como foi com o desmame, também chegará o momento de deixar o colo. Isso se chama ‘maturidade’!
O termo hebraico para ‘desmamar’ é גמל gamal que significa amadurecer. O que o salmista Davi está expressando é que, assim como uma criança desmamada se contenta simplesmente com a presença da mãe, assim acontece com aquele que se contenta com a presença de Deus. É na presença de Deus que Davi encontrava a segurança necessária e ali ele era amado e consolado.
Davi não ficou ressentido e amargurado por causa das acusações que foram levantadas contra ele. Fazendo uso da oração, ele fez calar e sossegar sua alma diante de Deus. Em oração, Davi recusou réplicas ou tréplicas com seus opositores. Ele preferiu entregar tudo nas mãos de Deus e viver de forma serena.
Assim como a criança desmamada se aquieta com os braços da mãe, assim o salmista que vez por outra se agita com as perseguições que enfrentara, descansa em saber que a vontade de Deus é sobre sua vida. É desta fora que sua alma consegue sossegar e se acalmar dentro dele.
A verdadeira maturidade cristã acontece quando colocamos nossa vida nas mãos do Senhor. Quando isso acontece, significa que crescemos, e esse crescimento não significa independência de Deus, mas confiança plena de que a vontade dele é agradável. Só é capaz de assim viver e agir aquele que, com sincera humildade, reconhece o poder e a graça de Deus.
Jesus Cristo falou sobre essa verdade quando disse aos seus discípulos: “E disse: Em verdade vos digo que, se não vos converterdes e não vos tornardes como crianças, de modo algum entrareis no reino dos céus. Portanto, aquele que se humilhar como esta criança, esse é o maior no reino dos céus” (Mt 18.3-4 ). Ser como criança, no cristianismo, é depender de Deus; é confiar em seu Senhor; é descansar em seus braços e demonstrar obediência.
Ainda há uma terceira lição sobre o caminho da humildade que o salmista no ensina. Vejamos:
iii. O caminho da humildade deve ser trilhado com esperança – Sl 131.3
De uma forma madura, serena e humilde, Davi disse para a nação: “Espera no Senhor, desde agora e para sempre”. Era como se ele estivesse dizendo: não apenas algumas vezes ao ano, mas em todos os momentos da vida “Espere, ó Israel, no Senhor”.
Davi faz um apelo à nação de Israel: “Espere, ó Israel, no Senhor”. Esse pedido é fruto de uma maturidade adquirida com profunda humildade e confiança no Senhor. Ele convoca ao povo de Israel para que também cresçam e amadureçam em plena confiança em Deus. Seu desejo é que coloquem sua esperança no Senhor e não em seus reis e governantes. Essa confiança não deveria existir apenas em algumas fases da vida, mas para sempre.
Davi, sendo rei de Israel, pede ao povo que depositem a sua esperança no Senhor e não nele. Davi reconhece sua necessidade de conduzir o povo aos pés do Senhor com humildade e esperança; isso revelaria o seu amadurecimento verdadeiro.
Mesmo que fossem escravizados, Israel deveria manter-se esperançosa no Senhor. Como a criança desmamada que se contenta com os braços da mãe, assim Israel deveria se contentar e se alegrar por estarem nas mãos do Deus todo poderoso.
Onde está a sua esperança? O que move o seu coração? O que traz alegria e prazer a sua vida? O caminho da humildade nos leva a reconhecer que sem Deus nada somos e, portanto, dependemos dele para sempre.
Nossa esperança no Senhor deve permanecer até que Ele venha e se estender até que estejamos em sua santa presença; portanto, espere no Senhor! Esperar exige humildade para reconhecer nossa dependência e maturidade para entendermos que o processo envolve ganhos e perdas; no final, a esperança nos manterá confiantes e contentes em saber que estamos nas mãos do Todo poderoso, para sempre!
Em Cristo Jesus deve estar a nossa esperança. Aquele que morreu e ressuscitou dos mortos ao terceiro dia. Aquele que desceu à sepultura, mas ressuscitou e subiu ao mais alto e sublime trono de glória e poder, onde está assentado a destra de Deus. Portanto, devemos esperar por Ele. E como disse o apóstolo Paulo: Se a nossa esperança em Cristo se limita apenas a esta vida, somos os mais infelizes de todos os homens (1Co 15.19 ).
Conclusão
O Salmo 131 nos ensina o caminho da humildade. Os peregrinos, nesse mundo de Deus, devem procurar mortificar a carne todos os dias na luta contra a arrogância. Precisamos pedir graça para não cair nas armadilhas das fantasias de grandeza, arrogância e presunção.
Por meio da oração devemos cultivar a humildade diante de Deus. Humildade e oração estão entrelaçadas. Quanto mais confiamos em Deus mais sinais de humildade ficam impressos em nossas vidas. O peregrino deve buscar, de forma humilde, o crescimento espiritual. Como peregrinos, devemos desviar das setas da arrogância reclinando nossa cabeça na providência de Deus. O coração calmo e sereno se manifesta naqueles que confiam e esperam pelo Senhor. Amém!
<1> Henry, Matthew. Comentário Bíblico - Antigo Testamento Volume 3 (Comentário Bíblico de Matthew Henry) . CPAD. Edição do Kindle.
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