Introdução
O que são os salmos com “cânticos de romagem ou peregrinação”? Os salmos de romagem são como um hinário dentro do saltério bíblico. Via de regra foram cantados quando Israel realizava sua peregrinação para adorar o Senhor em Sião. Cada passo, ou degrau, representava o resgate de lição preciosas sobre o relacionamento com Deus, porém, em pequenas porções – por assim dizer, lições bíblicas em miniaturas, mas com grande relevância e profundidade.
Por meio de breves poesias assuntos relacionados com a verdade de Deus, o pacto da graça, o deleite em Deus, família, angústia, amor, comunhão e esperança são resgatados para a edificação do povo de Deus.
Este é o primeiro dos “Cânticos de romagem ou peregrinação”. Eles começam no salmo 120 e finaliza no 134. Neles, encontramos lamentos, cânticos de confiança e de ações de graças, cânticos de sabedoria e celebração, como também de confissão.
O Salmo 120 é um lamento pessoal cantado por alguém que está vivendo longe de sua terra natal e que sofre com as más línguas mentirosas que se levantam contra ele promovendo guerras ao invés de paz. A expectativa do salmista é que a paz reine entre os povos, embora, quanto mais ele fala sobre ela, seus inimigos – que odeiam a paz, anseiam pela guerra.
Este salmo reflete o anseio que cada crente em Jesus precisa manter em sua vida enquanto peregrina neste mundo. Anseio pela paz eterna onde não haverá guerras, discórdias, divisões, ódio, sofrimento e morte. Em Cristo Jesus podemos desfrutar da verdadeira paz, como diz o apóstolo Paulo aos Filipenses “E a paz de Deus, que excede todo o entendimento, guardará o vosso coração e a vossa mente em Cristo Jesus” (Fp 4.7).
Este deve ser mais do que um anseio na vida cristã, precisa ser nossa realidade. Esta precisa ser a nossa oração como também o nosso comportamento. Enquanto caminhamos no Caminho da paz, que é Cristo, possamos buscar e perseverar nesta paz que excede todo entendimento.
É possível que, em tempos onde se deve buscar a paz e tranquilidade, há aqueles que buscam a guerra e a truculência. Por essa razão, precisamos ler e aprender com este salmo. O mais importante a se entender ao ler este salmo é a atitude do salmista. Há lições que podemos extrair para nossas vidas ao nos deparar com a atitude do salmista enquanto caminha em direção à Jerusalém. Há comportamentos que o salmista nos ensina para que possamos trilhar o caminho da paz. Vejamos:
i. Oração à Deus – v.1-2
O salmista abre seu coração diante de Deus e diz estar angustiado. Essa angústia é em razão daqueles com lábios mentirosos e língua enganadora que se levantam contra ele. A palavra “clamo” no texto, em sua tradução original significa chamar, gritar (por socorro), invocar (o nome de Deus).
Não se sabe ao certo que tipo de mentiras estavam levantando contra o salmista, mas o que se pode perceber, como dito antes, é a atitude do salmista diante desta situação – ele ora/clama, grita por socorro a Deus.
Quem cantou o salmo 120 estava com o coração muito ferido. Palavras mentirosas foram ditas contra ele (v. 2). Notícias falsas foram divulgadas a seu respeito e uma profunda angústia apertava seu peito por isso (v.1). É interessante observar o que ele diz: na minha angústia, clamo ao Senhor, ele mesmo clama. Ele mesmo ora. É a sua própria angústia, o seu próprio sofrimento e dor.
Ninguém melhor que nós mesmos é capaz de expressar a dor e angústia que sentimos. Ninguém melhor que nós mesmos é capaz de expor com tanta clareza o que verdadeiramente há por trás de um sorriso, de uma self no Instagram, de uma maquiagem no rosto e de uma máscara de felicidade.
O salmista clamou ao Senhor pedindo a ajuda dos céus. Enquanto os homens maus usavam as palavras para ferir os outros, o salmista usava as palavras para falar com Deus e entregar toda dor que apertava seu peito (v. 1). Enquanto as línguas de seus inimigos destruíam e enganavam, a sua orava a Deus.
Os peregrinos nesta terra sofrem dores e angústias, isto é uma realidade que não podemos mudar. Mas podemos, como o salmista, clamar a Deus. Podemos, enquanto trilhamos o caminho da paz, rogar àquele que é a verdadeira paz – Jesus Cristo. E a sua paz não é como a do mundo, pois Jesus diz: “Deixo com vocês a paz, a minha paz lhes dou; não lhes dou a paz como o mundo a dá. Que o coração de vocês não fique angustiado nem com medo” (Jo 14.27).
Além de orarmos a Deus, como o salmista fez, há também uma segunda atitude que precisamos aprender com ele, diante das circunstâncias da vida. Vejamos:
ii. Confiança em Deus – v.3-4
No salmista havia uma certeza: de que não precisava atacar seus inimigos pois Deus o faria por ele. Ele estava certo de que Deus castigaria o inimigo com as próprias armas, mas as consequências seriam muito piores.
“Setas agudas” eram instrumentos usados pelos soldados ou caçadores para atacar seus inimigos ou presas. Da mesma maneira, “brasas vivas de zimbro” era uma espécie de arbusto (árvore) espinhento do deserto que continha uma substância inflamável em suas raízes capaz não apenas de produzir fogo, mas também de mantê-lo por um longo período.
Com essa descrição o salmista expressa sua confiança na justiça de Deus que cairá sobre aqueles que lançaram setas de mentiras e engano sobre ele. Sobre eles virão setas de punição causando dor e sofrimento tal que resultará em destruição eterna por um fogo inextinguível.
Em outras palavras, o salmista está dizendo que o mentiroso e caluniador será ferido da mesma forma que um soldado é ferido, de maneira mortal, no campo de batalha e que o juízo de Deus virá sobre ele.
O salmista faz uma espécie de pergunta retórica. Ele mesmo pergunta e responde. Sua pergunta está relacionada à sua oração. Ele ora pedindo socorro a Deus e confia plenamente que Ele ouviu a sua oração <“...e=">“...e" ele="ele" me="me" ouve”="ouve”</span>" (v.1c)="(v.1c)">, e conclui com uma certeza de que a justiça e o julgamento de Deus cairão sobre seus inimigos.
Quando momentos como esses, onde a mentira e o engano recaem sobre nossas vidas, devemos entregar tudo nas mãos do Senhor e confiar que ele nos fará justiça. O que não pode faltar enquanto trilhamos o caminho da paz é a confiança em Deus.
É por essa razão que encontramos uma terceira atitude do salmista diante desse quadro. Vejamos:
iii. Perseverança em Deus – v.5-7
‘Meseque’ era uma cidade que ficava na Ásia Menor e ‘Quedar’ ao norte da Arábia. Temos aqui duas distintas cidades. ‘Meseque’ era uma nação gentia e o povo de ‘Quedar’ era descendentes de Ismael e eram considerados inimigos de Israel. Esses dois povos vivam longe de Israel. O salmista não está de fato, vivendo no meio desses povos, mas encontrava-se no meio de israelitas que se comportavam como pessoas de fora Aliança de Deus.
Qualquer israelita que temesse a Deus e guardasse os dez mandamentos não poderia dar falso testemunho nem difamar o nome de outra pessoa. O que o salmista expressa aqui é a decepção de encontrar israelitas que conheciam a Lei e não perseveram em manter a fé e obediência aos mandamentos de Deus, mesmo no meio de povos estrangeiros.
Simbolicamente, era como se ele estivesse dizendo: sinto-me frustrado por ter que morar no meio de pessoas que agem como quem não tem a lei de Deus e que nem mesmo o conhece.
Queridos, pior do que nos depararmos com a iniquidade dos ímpios é encaramos os pecados daqueles que deixaram de ser e viver como filhos de Deus. Os ímpios pelo menos fazem o que fazem seguindo a sua própria natureza caída. Nós cristãos, que conhecemos a verdade, agimos de maneira vergonhosa quando levantamos falso testemunho contra nosso irmão ou difamamos o seu nome porque sabemos o que devemos fazer o não fazemos. Aquele que persevera em Deus também persevera em sua Palavra e seus mandamentos.
Perceba que o salmista diz que, enquanto seus inimigos teimam em praticar a guerra por meio de mentiras e difamações, ele persevera e se mantém na paz. Sua postura é em conexão com o Deus que ele acabara de orar e clamar. Um Deus que nos livra dos lábios mentirosos e da língua enganadora, uma vez que em nossos lábios há um clamor pela verdade de Deus.
Os cristãos vivem não apenas no meio de incrédulos, mas também entre pessoas que se dizem cristãs, mas que agem como incrédulas. O salmista era um pacificador e tentou incentivar os vizinhos israelitas ímpios a também ser pacíficos e se manterem perseverantes na vida com Deus.
Grande parte dos problemas existentes nas famílias e nas igrejas são causados por pessoas que não perseveraram em conhecer e prosseguir em conhecer a Deus; pessoas que se dizem cristãs, mas que não têm um relacionamento real e vital com Jesus Cristo.
Perseverar em Deus significa pensar, sentir e agir como Ele; afinal de contas, fomos criados à sua imagem e semelhança. Perseverar em Deus é uma tarefa daquele que sabe a quem clamar em tempos de angústias. É uma atitude que só é possível para aquele que confia em seu Senhor e Rei; e sabe que Ele é o socorro bem presente.
Conclusão
Parece impossível que uma pessoa frustrada e angustiada encontre paz, mas nada é impossível para Deus. No Senhor, pessoas decepcionadas podem encontrar um caminho de libertação das amarguras, das angustias e das mentiras.
Que caminho é esse? O salmista tomou o caminho para Jerusalém, ele foi ao templo orar e derramar o seu coração diante do Senhor. Lá, ele meditou e viu a desgraça reservada para os mentirosos e enganadores. Cansado do mundo, no meio da peregrinação, ele tomou a firme resolução de viver pela paz no seu Deus.
E, você? Que direção você tomará agora? Não precisamos mais buscar o templo de Jerusalém. Hoje, em qualquer lugar, pessoas em qualquer lugar do mundo podem levar suas decepções aos pés de Jesus Cristo. Por meio dele podemos entregar nosso sofrimento diante de Deus.
Jesus foi ultrajado em nosso lugar para que pudéssemos ter paz com Deus e por causa do que ele fez em nosso lugar podemos nos voltar para Ele. O apóstolo Pedro escreve sobre essa verdade quando diz:
20 Pois que glória há, se, pecando e sendo castigados por isso, vocês o suportam com paciência? Se, entretanto, quando praticam o bem, vocês são igualmente afligidos e o suportam com paciência, isto é agradável a Deus. 21 Porque para isto mesmo vocês foram chamados, pois também Cristo sofreu no lugar de vocês, deixando exemplo para que vocês sigam os seus passos. 22 Ele não cometeu pecado, nem foi encontrado engano em sua boca. 23 Pois ele, quando insultado, não revidava com insultos; quando maltratado, não fazia ameaças, mas se entregava àquele que julga retamente (1Pe 2.20-23).
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